19.9.06

Eu não brigo pela audiência fácil

O jornalismo online que fazemos hoje não deixa de ser um jornalismo de resultado: todos brigam pela audiência, pela atenção do leitor, cada vez mais infiel, cada vez com menos tempo e paciência para ler notícias.

É um pouco diferente de alguns anos, quando, recém-chegados das redações dos impressos, fazíamos o jornalismo para nós mesmos, nossas fontes e coleguinhas. Ao leitor, só cabia ler.

Hoje, com a demanda do leitor saltando aos nossos olhos, com sistemas de audiência em tempo real nos mostrando o que ele procura e lê, sofremos com outro dilema: qual é o limite da entrega do que ele quer ver com o que ele necessariamente deveria receber?

Vivo isso todos os dias, mas ontem e no fim de semana vivi de novo um tormento.

Com o mais novo escândalo do governo na praça, começaram a circular batos sobre o conteúdo do tal DVD que seria usado contra o candidato tucano ao governo paulista José Serra. No próprio sábado lá estava ele num site de Mato Grosso, Olhar Direto, do qual eu nunca tinha ouvido falar, talvez por absoluta ignorância de minha parte em relação a sites de notícias do interior do país.

O fato é que na madrugada de domingo o blogueiro da Folha Josias de Souza postou sobre o conteúdo do DVD dizendo que a PF confirmava sua veracidade e entregou o endereço de onde achá-lo. Em pouco tempo, outros sites de notícias e portais foram atrás e manchetaram o mesmo.

Não tínhamos essas informações no site onde trabalho. Tentamos a PF: nada. Sequer conseguimos ver as images que comprometeriam Serra no tal evento de ambulâncias: o filme de 23 mega não baixava de forma alguma, talvez devido ao grande número de acessos. Para mim a posição era clara: só daríamos as imagens ou o conteúdo contido nelas diante de uma posição formal da PF sobre as mesmas. Princípio básico do jornalimo: não publicar qq coisa. Principalmente, sem sequer ter visto as imagens do tal DVD.

Por volta de uma hora depois, os sites retiraram o tema das manchetes e recuaram para o mesmo ponto onde estávamos. No fim do dia, ninguém falava mais no tema, ultrapassado pela avalanche de desdobramentos da história.

Na segunda-feira, o episódio foi ainda mais instigante: o vídeo da Cicarelli transando com o namorado numa praia espanhola. Vários sites de notícias (notícias, não de fofocas) publicaram imagens, contavam detalhes e davam o link para o vídeo, retirado do You Tube e migrado para o Porno Tube.

Um repórter vem me perguntar: Damos? Não conseguimos falar com ela para repercutir, mas tá todo mundo dando.

Rodinhas em torno dos computadores da redação denunciavam a mobilização pelo tema. Cicarelli era uma das palavras mais buscadas no nosso sistema de busca. O mais novo concorrente também estava dando.

Não demos. Uma celebridade flagrada por um paparazzo transando com o namorado absolutamente bombaria a audiência. Mas é notícia???? Para mim, não é. Notícia pode até ser a suíte do caso: o paparazzo ser preso, a moça romper com algum patrocinador por conta da repercussão.

Não, não recuo. Não quero essa audiência fácil.

Fazemos jornalismo, o mesmo da TV, dos impressos. Só que o nosso é o online, aquele, clandestino, acusado de pouco siso e responsabilidade. Temos a obrigação de fortalecer a credibilidade de nosso meio, fazendo um jornalismo de maior qualidade. Não acredito na flexibilidade que tentam nos empurrar garganta a baixo, defendendo a publicação de qualquer coisa, justificada pela fluidez do processo : ah, mas é internet, na internet pode.

Desculpem, mas para mim, não pode.

O drama da autoria

Todo jornalista é vaidoso e narcisista. É uma verdade incontestável, me perdoem.
Por isso, na minha avaliação, o mais difícil exercício na implementação de qualquer experiência de jornalismo participativo na mídia tradicional é justamente esse: administrar os egos nas redações.

Como convencer a um jovem repórter que a opinião ou o conteúdo produzido por um leitor vai dividir espaço na publicação com a matéria dele??? Como explicar a um experiente editor que aquele leitor passivo não existe mais e que se ele não se enxergar retratado de alguma forma nas páginas do impresso, na TV ou nos sites de notícias ele vai buscar alguma outra forma de expor seu conteúdo ( e quem perde esse leitor é a mídia tradicional )?

Quando, há mais de um ano, falamos de interatividade e jornalismo participativo pela primeira vez no site onde trabalho, uma experiente colega falou:

- Quer dizer que nós vamos ficar com essa parte chata do trabalho de ficar recebendo sugestão de leitor, conteúdo de leitor e opinião de leitor???? Mas nós somos jornalistas!!!!

Sim!!!

E, felizmente, para muita gente que consegue perceber a mudança no nosso papel e na nossa profissão nada disso é chato.

Redesenho e novos conceitos

O site onde trabalho e onde sou editora de conteúdo passou por um gigantesca reformulação agora em agosto. Aos poucos, começo agora a emergir dessa transformação que, sem nenhuma falsa modéstia, nos deixou na posição de melhor site de notícias do país.

Sim, porque não foi apenas uma mudança de layout, mas a incorporação de conceitos de jornalismo participativo e interatividade num site de jornal tradicionalíssimo, além de melhorias em navegação e usabilidade e muito mais multimídia.

Alguns pontos interessantes sobre essas mudanças todas:

1. COMENTE - Todas as matérias do site têm a possibilidade de receber comentários de leitores. TUDO pode ser comentado pelos leitores cadastrados no site. Temos alguns mecanismos de proteção contra ataques e filtros para comentários indesejáveis. E ainda não colocamos a opção em todas as matérias porque temos que fiscalizar esses comentários e tememos nossa capacidade de absorver essa tsunami de interatividade. Mas, como disse uma amiga, é genial ver as pessoas discutirem determinados temas como se fosse um blog, quase como se estivessem numa mesa de botequim!!!

2. Eu-repórter - Nossos leitores podem contribuir para a construção do conteúdo, enviando vídeos, áudios, textos, fotos. A equipe do site avalia a relevância e veracidade da informação e publica o conteúdo. Já recebemos muitas fotos, textos e até vídeos. E o aproveitamento tem sido de mais de 50%. Ok, muitos sites lá fora já fazem isso e concorrentes aqui no Brasil como o iG e o Estadão também têm iniciativas nesse sentido. Mas duvido que seja da forma como estamos fazendo, sem criar um geuto do leitor. Para a mídia tradicional isso é uma revolução.

3. Menu horizontal e resolução 1024 - Somos o primeiro site de notícias do país a adotar a resolução maior e a assumir isso colocando conteúdo de verdade ali. Também mudamos nosso menu para a posição horizontal, o que nos obriga a sermos mais organizados e facilita a vida do leitor que não fica mais perdido quando entra em especiais e subeditorias.

4. Mais multimídia - A febre atual do You Tube não nos surpreendeu. Sabíamos que vídeo é um formato de conteúdo importante para web e apesar de sermos uma site de jornal apostamos nisso há quase dois anos, estudando linguagem e formando pessoas. Estamos com uma produção/publicação semanal de 15 vídeos e trabalhamos para montar uma grade.

5. Fotos, fotos, fotos - Outra aposta antiga do site, mas acho que agora assumimos isso de fato. Criamos um plantão de fotos, com as imagens publicadas em ordem cronológica, como no plantão de notícias.

6. Novos formatos de entrega e personalização - RSS, podcasting, news alert, SMS. Abraçamos o conceito de audiência: você não precisa vir até aqui, me diga onde vc está que eu te entrego o que vc quiser.

Enfim, o resultado é lindo e começa a render frutos: a audiência cresce e a fidelização de nossos leitores também. Se quiser ver mais, clique aqui

Parada nos boxes

Este blog ficou abandonado por mais de dois meses. O motivo foi nobre: o redesenho do site onde trabalho. Valeu a pena. Mas já estou de volta!